O Curioso Caso de Benjamin Button, de David Fincher - Quando vejo as descabidas comparações do filme de Fincher com "Forrest Gump", fico imaginando se as pessoas não conseguem enxergar nos filmes algo mais além de um roteiro. Porque fora alguns elementos de roteiro, não sobra nada do medíocre filme de Zemeckis: enquanto em Gump, vemos a história de um idiota alheio aos acontecimentos de sua própria vida e uma apologia à ignorância (quem tenta algo, como sua namoradinha, só se fode), o que interessa a Fincher é o efeito do tempo sobre o ser humano (algo já trabalhado em "Zodíaco", com maior intensidade psicológica). Seu filme atribui responsabilidade aos personagens por suas próprias vidas, que devem seguir adiante, não só frente à passagem do tempo, mas também diante das forças da natureza: o acaso (bela sequência a do atropelamento), os raios que por sete vezes já atingiram um homem, o Katrina em New Orleans. Eu queria ter gostado mais do filme, que é bem bonito, mas Fincher quase perde as estribeiras, encantado com os brinquedinhos tecnológicos de seu filme (efeitos, maquiagem e fotografia espetaculares) que quase sufocam a narrativa. É tudo muito over, eu já estava temendo que a Julia Ormond aparecesse envelhecida (deram um jeito até para Tilda Swinton), e aquela sequência final com cara de propaganda dos funcionários do Banco do Brasil é pavorosa. Mas o todo flui muito bem, Brad Pitt se sobressai no elenco, especialmente quando velho, e há mais belos momentos do que ruins.
A Troca, de Clint Eastwood - O grande filme deste início de ano. Recomendo enfaticamente as três críticas do filme publicadas na Revista Cinética, abordando muitos dos aspectos que fazem este filme de Eastwood tão especial. Do meu lado, fico com aquela primeira parte excepcional, uma aula de concisão, de como estabelecer uma relação com tamanha elegância de planos e montagem, como dizer tanto com simples movimentações e posicionamentos de câmera; fico com a facilidade com que Eastwood transita pelos gêneros, como torna assustadora a presença da criança trocada, como o horror vem de um serial killer, de um delegado, de um hospício; fico com a igualmente assustadora obsessão da protagonista, brilhantemente retratada numa sequência próxima ao final onde ela é enquadrada pela câmera como se estivesse atrás das grades; fico com todo o primor técnico do filme que nos leva a uma Los Angeles mítica; enfim, fico com Clint Eastwood, esse gênio que conta um melodrama como ninguém, e que no processo continua seus questionamentos sobre violência institucionalizada, sobre o mal que está presente na sociedade, mas que não sabemos ao certo de onde surgiu. Tudo de forma elegante, fina, nos lembrando que uma história bem contada em cinema significa saber até quando se continua um plano, o momento certo de se cortar, o local ideal para uma câmera e seus movimentos.
Rio Congelado, de Courtney Hunt - Com 15 minutos de "Frozen River", eu já sabia exatamente o tipo de filme que me esperava: o típico "cinema independente americano", a mais fiel cria de Sundance. E realmente é algo como "família savage no gelo", com personagens ordinários em situações banais de conflitos familiares e a visão condescendente da diretora, passando a mão na cabeça de todos e esvaindo qualquer possibilidade de complexidade. Nem mesmo o distante e isolado local onde se passa o filme tem utilidade para a câmera, nunca se tornando um espaço realmente interessante, e o filme poderia ter se passado na ensolarada Miami, que daria no mesmo. Se alguém enxerga nesse tipo de cinema algo de bom (e com certeza enxergam, duas indicações ao Oscar comprovam isso), vai adorar "Rio Congelado". Eu não tenho mais paciência pra esse tipo de coisa e vou pensar dez vezes antes de me arriscar por outro projeto com o selo de qualidade Sundance.